quinta-feira, 23 de junho de 2016

A DANÇA

“Pé de valsa” desde os dezesseis anos quando foi arrastado pelos amigos aos primeiros bailes, o que mais Felipe gosta nas horas de lazer é dançar. Ocupa todas as noites de final de semana nos salões. Poucos conhecem e fazem uso da arte como ele.

Samba, pagode, axé, lambada, até forró, ficam mais animados quando ele se apresenta no salão.

Já não é ele quem se preocupa em convidar as moças para dançar. Elas é que disputam a oportunidade de ter uma dança que seja com o rei do salão.

Guiadas por ele, as moças flutuam como penas e não raras vezes todo o salão para para admirar a beleza da dança de Felipe.

Apesar disso, ele jamais conseguiu que Marta, sua esposa, o acompanhasse numa dança. Esta é a tristeza da vida de Felipe. Mesmo no dia do casamento deles foi cancelada a dança dos noivos porque Marta fugiu na hora em que a valsa foi anunciada.

Ela, às vezes, o acompanha ao salão, mas lá, planta-se a um canto e dali somente sai para voltar para casa.

Felipe e Marta, embora não tenham filhos, formam um casal feliz. Não que só sejam felizes os casais com filhos, mas que os filhos verdadeiramente fazem a alegria dos casais, isso não há dúvida. Também o fato de não terem filhos não é uma opção do casal. Eles querem, mas também não se entristecem com a demora.

Marta sempre foi reservada. Não foi moça muito festeira, ao contrário, era muito caseira. Tímida, custou a aceitar o pedido de namoro de Felipe. E só o aceitou porque o irmão, amigo de infância de Felipe, o apresentou com as melhores referências. Aos seus olhos, Felipe era um estroina, um vulgar... E o irmão teimava que não.

Seu irmão não era como o amigo. Não sabia conduzir uma dança. Gostava mais de futebol. Não podia ter notícias de um bate-bola que já corria para lá. Se possível era o primeiro a chegar e o último a sair. Mesmo depois de casado muitas vezes deixava a esposa para correr atrás de uma bola.

A esposa, sem outras alternativas, ligava-se à televisão. Novelas, filmes, shows. Tudo, menos futebol.

Diferente da cunhada, sua mocidade já foi mais expansiva. Ia a festas, shows, bailes. Teve uma juventude mais divertida em relação à cunhada. Foi nesse tempo que tomou gosto pela dança. Não era exímia dançarina, mas se divertia.

Com as constantes partidas de futebol do marido e algumas discussões entre eles, ela volta a frequentar os bailes abandonados com o casamento. Assim, depois de um bom período de afastamento, ela volta às pistas.

Samba, forró, pagode, axé, fazem com que ela se esqueça dos problemas cotidianos. Seu belo corpo se embala e não quer mais parar.

Marta, com o tempo, às vezes, acompanhava Felipe. Foi assim que um dia convence o irmão e a cunhada a acompanhá-los.

No salão, depois de reservada uma mesa, e entre uma bebida e outra, Felipe se dirige com a concunhada para a pista de dança e deixam Marta e o irmão guardando seus lugares à mesa.

Na pista de dança, passam bons momentos. Seus corpos agitam-se de um lado para o outro, completamente entregues à música que embala o ambiente. Perdem a noção do tempo. A dança é, para eles, a expressão máxima do prazer. Ali, naquele salão, entregues à dança, era como se estivessem cada um na intimidade de seu lar.

Junto à mesa, Marta e o irmão seguem numa conversa alheia e tediante. Chega-lhes um velho companheiro de futebol e frequentador dos salões. Depois de os cumprimentar, beijando o rosto de Marta (beijo que ela recebe com certo desagrado), pergunta por Felipe. Informado que se encontram na pista de dança, procura-os com o olhar inquieto e inquiridor. Não os vendo, volta-se para os irmãos e comenta.

- “Enquanto eles estão dançando, vocês é que dançam”.

(Paulo de Morais)

quinta-feira, 12 de maio de 2016

MULHERES







As mulheres que, por mais que desejem, jamais se igualarão aos homens. Vejam que desde o princípio da humanidade, pelo menos no que se tem registro, a mulher sempre foi submissa ao homem, sempre abandonada ao plano inferior. A mulher não podia estudar. Era-lhe negado este direito. Poucas lutavam contra esse tipo de preconceito e conseguiam destacar-se nas diversas sociedades. Mas o chamado sexo frágil com o tempo ganhou espaço, principalmente na segunda metade do século XX. Mesmo assim, a igualdade está longe de ser alcançada.

O desenvolvimento tecnológico possibilitou algumas mudanças que lhes facilitaram a vida. Assim, as antigas donas de casa disponibilizaram tempo para novas tarefas que as levaram a conquistar profissões antes inimagináveis, além de um aperfeiçoamento cultural que assombra.

Isso gerou um caos na sociedade e uma exigência de revisão do comportamento familiar. Em muitos casos houve até uma inversão de papéis, ou seja, enquanto o homem, que perde espaço, fica em casa nos afazeres domésticos, a mulher sai para ganhar o sustento da família.

Será que essa mudança é benéfica? A medida de competência não está na questão sexual, mas na questão moral. As mulheres podem igualar-se aos homens, e até superá-los, profissionalmente, mas, por questões que lhes fogem à vontade, jamais estabelecerão a igualdade entre os sexos.

Se por um lado os avanços tecnológicos as favorecem, por outro elas favorecem a sociedade porque são as grandes propulsoras do progresso humano. Por mais que queiram ser vistas em pé de igualdade com os homens, a natureza colabora para que isto não ocorra. A elas compete a tarefa mais importante pela qual jamais serão igualadas aos homens: gerar a vida e guiá-la (até mesmo a dos homens, ao menos quando crianças).



Vejam o exemplo da Mãe Universal da Cristandade – Maria. Não nos consta que ela desejava realizar uma grande missão na vida. No entanto, o que aconteceu? Realizou uma missão extraordinária quando se tornou mãe do Salvador da Humanidade.


Outras mulheres há que colaboraram com o Mestre durante a sua permanência visível entre os homens. Exemplos: a samaritana, Madalena, Marta e Maria, aquela não nomeada que ungiu os pés do Senhor e outras citadas por Lucas no capítulo 8.

Outras mulheres destacaram-se no transcorrer da história humana: Joana D’Arc, Madre Teresa, Princesa Isabel que, a 13 de maio de 1888, assinou a Lei Áurea que acabava com a escravidão no Brasil. A escravidão, essa mancha que contaminou a pátria do Evangelho durante a época da colonização.
Escravos trabalhando na colheita de cana-de-açúcar
Mancha que foi, aos poucos, sendo destruída pelas leis Eusébio de Queirós (que proibia o tráfico de escravos), a do ventre livre e do Sexagenário. E o Brasil foi o último país do mundo a abolir a escravidão.

Hoje, os escravos são outros. Somos todos nós: escravos do tempo, do dinheiro, da vida social etc. E a pergunta é: onde está nossa princesa Isabel? Quem há de libertar os escravos modernos? As mães. Elas é que podem fazer isso, inspiradas pela Mãe Universal – Maria, a quem clamo numa oração de paz:




segunda-feira, 2 de maio de 2016

DE RUI AOS NOSSOS DIAS: O QUE MUDA NA EDUCAÇÃO?

No último século, não obstante os esforços de alguns, como salientou Arnaldo Niskier,
Arnaldo Niskier
“a qualidade do que foi oferecido aos alunos é suspeita”. A escassez de bons profissionais, aliada a outros fatores, contribui para o empobrecimento do Ensino.


            Apesar da falta de incentivo à leitura no lar, nas escolas, no dia a dia, algumas pessoas têm o hábito de ler jornais e revistas, mas de forma superficial. Aliar a essa leitura cotidiana uma leitura técnica implica enorme sacrifício: não há tempo disponível; os livros são caros; não estou com cabeça para pensar em questões gramaticais – são algumas desculpas que se ouve todo momento, refletindo a realidade, contra a qual Rui Barbosa escreve, em uma de suas imortais sentenças:
Rui Barbosa
“Uma reforma radical do ensino público é a primeira de todas as necessidades da Pátria, amesquinhada pelo desprezo da cultura científica e pela insigne deseducação do povo.” E conclui: “O Estado tem deveres para com a ciência. Cabe-lhe, na propagação dela, um papel de primeira ordem.”


           Vê-se, por um lado, nas palavras do Águia de Haia, que o primordial problema brasileiro, hoje enfocado pelo professor Niskier, resiste ao tempo devido a pusilanimidade dos que juraram contra ele luta sem tréguas.

           Por outro, se o Estado der Educação para o povo, contrariando o “pão e circo”, não poderá dominá-lo. Razão porque condena-o, adotando sistemas que fazem com que as crianças e os jovens – que, muitas vezes, já vêm predeterminados à vadiagem escolar – sejam ainda mais desleixados quanto aos estudos. Com o passar do tempo, tem-se uma sociedade estéril, alheia da literatura nacional, e – o que é pior – cega.

Diante disso, o profissional de Letras tem de trabalhar sozinho, sacrificando-se em benefício de seus alunos, que, ante a complexidade da língua portuguesa, não sabem o que fazer. Como saber se se fala e se escreve de acordo com a norma exigida? Que comportamento deve-se ter diante das muitas situações que surgem na vida? São os desafios que fazem crescer a importância daqueles que na Educação trabalham.

No entanto, a tarefa desses profissionais não se restringe apenas em ensinar normas gramaticais. É, antes de tudo, um trabalho de formação da cidadania que, se bem cumprido, torna melhor o país.

Os causadores de confusão nas cabeças das crianças e dos jovens que, na escola, aprendem como se deve escrever, são os erros ortográficos que se veem pelas ruas, nas placas de anúncios, painéis, além de uma infinidade de erros transmitidos pelos meios de comunicação que são assimilados e dificultam, ainda mais, o acesso dos jovens brasileiros a melhores salários, melhores representações políticas etc.


Lutar contra esses deslizes propagados pelos que, em nome de uma liberdade de expressão, têm pela língua nacional um verdadeiro descaso, requer dedicação, conhecimento profundo e jogo de cintura daquele que educa. A vasta problemática exige tempo e vocação, mas apontar soluções é tarefa do profissional de Letras, que deve amenizar o terrível quadro apresentado no século XX, para, numa progressão geométrica, mudá-lo completamente. Necessário se faz, portanto, incentivo, realização de dinâmicas, interações com as crianças e com os jovens, para tornar o aprendizado uma atividade divertida e agradável, no intuito de que os brasileiros do futuro comecem a usar corretamente a língua portuguesa, desde a mais tenra idade.

sábado, 30 de abril de 2016

UM DIA NORMAL (PARADOXOS)

         Aquele parecia um dia normal. A fria garoa da madrugada paulista caía incessante. As ruas e avenidas, aos poucos, enchiam-se de carros e transeuntes. Em meio a tudo isso o sol desponta generoso. Parece que toda a natureza desperta reverenciando o disco dourado. Poucos são os Homens que dispensam um minuto de seu tempo para contemplar rara beleza.
        
        Os primeiros raios do sol, penetrando entre as frestas dos portentosos edifícios da capital, vão tomando o lugar das gotas de orvalho deixadas pela garoa da madrugada. Rapidamente as ruas e avenidas enchem–se mais de automóveis e de gente, sempre apressadas, em busca de seus destinos.

Realmente parecia um dia comum.

O perfume do amanhecer substitui o aroma da noite. Em qualquer outro local, nessa hora tudo é silêncio. Mas nessa cidade que nunca dorme, as pessoas apenas substituem-se umas às outras num incessante vaivém.

Na padaria da esquina, após uma gostosa espreguiçada, sentindo o cheiro do cafezinho quente, cujo vapor paira no ar, misturando-se à fumaça dos cigarros (e isso foi escrito num tempo em que não havia a lei contra o fumo), saboreando o pãozinho com manteiga, na primeira reunião social do dia, o que predomina é a discussão sobre o clássico de maior rivalidade do futebol paulista disputado no dia anterior: Corinthians e Palmeiras.

Tinha tudo para ser um lindo dia. No entanto, os gases emitidos pelos veículos tornavam o ar pesado e sombrio, e o burburinho da madrugada cedia lugar à fanfarra de buzinas e ronco dos motores. A atmosfera tornava-se cada vez mais cinzenta. E nesse clima não era só o ambiente que se acizentava. O semblante das pessoas já se tornava diferente. Naqueles rostos (que antes expressavam num sorriso natural, franco e aberto), que se cruzavam nas ruas, o desejo mútuo de um bom dia, aos poucos, dava lugar a rostos fechados e sombrios.

Ao passo que o dia torna-se mais claro, as pessoas fecham-se ainda mais. Tornam-se diferentes, até mesmo indiferentes umas com as outras. Olham-se não mais com simpatia, mas com desconfiança. A cordialidade cede lugar à indiferença.
Quase ninguém se dá conta da mão estendida suplicando pela caridade alheia. Em um templo religioso, oram, pedindo para si, mas quando a caridade solicita seu concurso fraterno, apenas resmungam uma desculpa.

Esse era um dia comum.

O comércio descerra suas portas para mais um dia. Mais um dia que provavelmente será igual aos demais. As pessoas entram nas lojas, olham tudo e prometem voltar mais tarde, saindo da mesma forma que entraram. É o reflexo da crise.

As ruas e avenidas já totalmente tomadas por veículos parecem sufocadas. Os ônibus passam lotados pelos corredores. Para se conseguir uma vaga em um deles o sofrimento é enorme. O empurra-empurra é geral. O cavalheirismo de outros tempos já não existe. A luta pela sobrevivência o matou. Cada um por si e os demais que se cuidem. Quem mais sofre é o idoso que, muitas vezes, é deixado para trás.

Esse parecia um dia comum, porém pairava no ar um clima deferente. Densas nuvens avançavam sobre a cidade.

O dia claro tornou-se tão escuro como a noite. A chuva desabou. As pessoas, apanhadas de surpresa, corriam ainda mais, abrigando-se sob as marquises.

Por um rápido instante toda a cidade parou. Mesmo que se desejasse, a chuva não permitia prosseguir. Chovia torrencialmente. Uma viagem no Metrô estava mais disputada que nunca. Os trens, lotados, passavam lentos pelas estações. Era a operação tartaruga, montada em protesto por salários mais altos e melhores condições de trabalho.

Nesse dia uma quantidade maior de pessoas circulava pela cidade, tomando ônibus, trens e Metrô.

Tão de repente como veio, a chuva parou. As pessoas retomaram seus destinos, enfrentando, ainda, a água que corria pelas calçadas. O trânsito transformou-se num caos ainda maior. Por todos os lados veículos abandonados sem condições de prosseguir. Viaturas da polícia e do corpo de bombeiros circulavam o mais rápido que podiam para atender a chamados de emergência.

Enquanto isso, dissiparam-se as nuvens, deixando o céu tão claro quanto antes e o sol voltou a brilhar. A cidade, porém, continuava caótica.

Com o correr das horas o dia retornava à normalidade. A chuva da manhã fez uma limpeza no ambiente e a tarde nascia com o ar mais leve. O centro da cidade, em contraste aos bairros, fervilhava. No entanto, mais movimentado que o centro estava a Avenida Paulista naquela tarde. Todas as atenções se voltavam para lá. Militantes do sindicato dos metroviários, unidos a outros grupos, agitavam a avenida que se assemelhava a um formigueiro humano.

Agitando enormes bandeiras e distribuindo panfletos, a massa agitava-se seguindo um caminhão de som, onde líderes do movimento discursavam alertando a população.

Cercados por policiais que procuravam manter a paz da movimentação, a massa seguia em passeata em direção a Praça da Sé – marco zero da capital paulista.

O trânsito, desviado para avenidas das redondezas, tornou-se novamente caótico.

Todas as reivindicações do movimento resumiam-se em melhores condições de trabalho e salários mais altos.

Chicão, um dos líderes desse movimento, deixava isso bem claro quando inflamava a multidão com seu discurso:


“Nós fomos surpreendidos com o pacote econômico lançado pouco depois das eleições. Aumento de impostos, arrocho salarial e a desaceleração da economia provocam mais desemprego e recessão. A desculpa é de que precisa pagar dívidas contraídas no exterior. Estes compromissos financeiros já existiam há muito tempo e o governo poderia ter tomado medidas antes para evitar esta situação. Mas preferiu gastar milhões em publicidade no período pré-eleitoral e agora apresenta a conta aos trabalhadores e à população, através de um pacote perverso. Conclamamos a todos a participarem da luta para garantir emprego, direitos trabalhistas e transporte.”

terça-feira, 26 de abril de 2016

Como negar o Amor?

O encontro entre almas afins causa uma sensação de imensa alegria, mesmo que durante longo período de tempo haja transcorrido na Terra ou no espaço sem se verem e se tocarem. Esse período de ausência física não tem o poder de destruir o sentimento nutrido.

Quando, finalmente, a Providência Divina permite o reencontro dessas almas, elas se sentem completas, entregam-se voluntariamente ao toque do ser amado, sentem-se leves como se toda carga (que os fizeram sofrer) fosse retirada de seus ombros e o tempo parece parar para que haja a devida recompensa de todos os martírios, de todas as lutas, de todas as dificuldades, de toda distância que os separou. Sentem-se uma complementar da outra. Mais que isso: sentem-se única. Não são mais duas almas, mas uma somente, vivendo a plenitude do amor integral.


Diante dessa força, como fingir que nada acontece?