sábado, 29 de março de 2008

O JULGAMENTO

O réu apresenta-se ao tribunal do júri conduzido por dois policiais. Sentado no banco dos réus, junto ao advogado cedido pelo estado, cujos honorários ele não poderia pagar, deixa a velha bengala, da qual jamais se separou, repousar sobre a coxa da perna direita, a mesma que o fazia levemente manco.
Em seus trinta e quatro anos de idade jamais estivera em um tribunal. Era réu primário: acusado de estupro. Em sua defesa, nada. A mulher que o acusara ajuntou testemunhas que a auxiliavam, enquanto que ele, sozinho no mundo, na condição de réu, jamais pôde contar com tal ajuda.
Dizia-se inocente. Entretanto sua voz estava só contra dezenas de outras vozes a acusarem-no.
Naquele tribunal não havia ninguém que o conhecesse. Com exceção de seu advogado, cuja fama estendia-se de longe, ninguém ousava defendê-lo. Com o semblante calmo (quase todos os réus transmitem tranqüilidade), ouvia as acusações lançadas contra a sua pessoa.
Foi num entardecer paulista que tudo ocorreu...
Ele, sentado num banco do parque Ibirapuera, aguardava o passar das horas. Ela, no auge dos seus vinte anos, para desfrutar o fim daquele dia quente, corria de forma cadenciada pelo parque. Semicoberto, seu corpo exalava feminilidade.
Os minutos correm... e muitos já se dirigem para suas casas. Eles permaneciam ali. Ele, estático, paralisado no tempo, e ela repetindo movimentos aeróbicos e de alongamento. Quando parou, foi sentar-se ao lado dele. A quietude do ambiente e a quase solidão de ambos tornavam possível ouvir as batidas ritmadas do coração que animava aquele corpo de mulher.
Depois de pequena conversação, ele a pega pelo braço e saem. Foi nessa tarde que teve início o seu inferno.
Era massacrado pelas declarações das testemunhas e pelo discurso do promotor. Seu crime? Estupro. Um dos mais violentos do código penal.
Inquirida, a acusante não poupou palavras para denegri-lo. Suas afirmações eram agudas farpas contra aquele homem que, de forma tão violenta, abusara da sua fragilidade feminina.
Todos os presentes ouviam-na profundamente chocados.
Ele permanecia no mais absoluto silêncio. Não fosse ali um tribunal do júri, seria linchado até à morte.
Depois das inquirições preliminares às testemunhas e à acusante, o promotor lembra a condição desse homem solitário, desprezado pela maioria, digno de piedade e, por isso mesmo, astuto autor de crime bárbaro como esse. Razão por que pediu sua condenação.
Por sua vez o advogado de defesa, depois de relembrar os fatos ocorridos naquela tarde, como foi narrado por todas as testemunhas, e a detalhada descrição da acusante, quando esta encontrou aquele homem sentado no banco do parque, como ele a segurou pelo braço, a dificuldade do percurso até o local onde tudo se consumou, o que foi totalmente confirmado pelo réu, concluiu:
- Só uma questão ainda permanece sem resposta: quem conduziu o ceguinho?

(Paulo de Morais. Conto premiado no Concurso “A Paixão Pelo Conto”, promovido pela Academia Brasileira de Letras e publicado no JORNAL DE LETRAS)

ECLIPSE

Preconiza uma antiga lenda popular
Que o sol enfim se apaixona pela lua,
Mas Cronos, ao vê-la completamente nua,
Enciumado, resolve os dois distanciar.

Para a lua que vaga sozinha no espaço
Jamais ser alcançada pelo astro-rei,
A distância que entre eles calculei
É a de uma desilusão e um forte abraço.

Para que a chama do amor não fosse perdida
Deu-lhes Cronos única chance na vida
De se encontrarem a sós em noite serena.

No desenrolar da história, assim somos nós:
Enquanto te busco, ao som de tua voz,
Foges de mim e jamais te alcanço. Que pena!


(Paulo de Morais
Livro: Horas Mortas)

O CANTO DA SEREIA

De longe, ouço o canto de uma sereia
Aguço os ouvidos, e tremo então,
Meus pés deslizam sobre a areia
Por ter preso meu coração.
(Paulo de Morais
Livro: Tardes Trigueiras)

Eu tinha um sonho

Eu tinha um sonho...
Era doce como todos os sonhos
Mal me continha para saborear
Os benefícios que meu sonho anunciava...
Um fato, porém,
Fez meu sonho desvanecer:
Deixei-o sobre a mesa
E ele virou pesadelo
Em algum intestino delgado.

(Paulo de Morais
Livro: Tardes Trigueiras)

ANO NOVO – POESIA NOVA

Sou como o ano novo: esperado,
Cortejo de encantos, sorte, magia,
Preto, vermelho, branco, azul, bramia
A palavra do ensejo bem traçado.

Mesmo o desejo que sério podia
Parecer, no verso surgiu truncado
Por obra e graça do bissexto, fado
Impressor de demorada euforia.

Quando chego: festas por todo lado,
Fogos de artifício espocam no céu
Da noite feita clara como o dia

Porque um novo ano é aguardado,
Sobre mim vem do esquecimento o véu...
Assim sou eu – a eterna Poesia.


(Paulo de Morais
Livro: Tardes Trigueiras)

CAPITU

(Mote: Machado de Assis - Dom Casmurro)

“Oh! flor do céu! oh! flor cândida e pura!”
Oh! peregrina luz do meu deleite
Ao recordar o amor que cedo dei-te
Aflige meu corpo a febril tontura.

Lembrou-me a hora quando a sós – loucura! –
Breve infinito – tua boca beijei-te...
Depois, solene, meus votos jurei-te
E tenho o céu testemunha da jura.

Tu, entretanto, aos meus braços fugiste,
Traindo-me, a ti mesma traíste,
Atada ao negro manto da mortalha.

Vivi, deveras o melhor que pude
Sem me faltar amores, fé e virtude:
“Ganha-se a vida, perde-se a batalha.”

(Paulo de Morais
Livro: Mosaico – editora Andross)

EM ALGUM LUGAR DO FUTURO

De repente, paro no tempo, extasiado.
Tudo à minha volta perde a importância.
Sou levado em pensamento à distância
e vou me encontrar em algum lugar do passado.

Olho em derredor e reconheço calado
que o tempo passou e os idos de infância
se foram também... e já não mais criança
tenho agora a quem chamo amor ao meu lado.

E assim também em viagem ao futuro
em meu pensamento que voa logo procuro
um lugar qualquer para nosso cantinho...

Mas alguém me chama e é dura a realidade
quando dentro do peito sinto doer a saudade
da pomba errante tão longe do meu ninho.

(Paulo de Morais
Livro: O Poeta e Seus Amores)

SEDUÇÃO

Não sei se há prazer maior
A iludir-me o coração;
Sei, apenas, que a paixão
Faz de ti o meu xodó.

***

Há muito tempo começou –
Nem sei precisar quando ...
Talvez numa tarde de inverno,
Ou talvez num dia tão quente
Quando pareceu-me que o inferno
Veio morar com a gente.
Não sei se era o dia,
Mas teu olhar –
Um olhar ardente –
Acenou-me com poesia.

Oh! exclamei
E tua face mirei
Com ternura e desejo.
Ensaiei, de longe, o cortejo,
E, entre decidido e temeroso,
Meus primeiros passos dei.

***

Com o olhar atento,
Reparei na dicotomia do teu corpo...
Distanciadas e encobertas
Convidavam-me
Ao mergulho profundo no misterioso pote do tesouro com que me
[acenavas...
Vivi todo esse tempo.
E agora, nuas, entrelaçadas,
Abraçam-me por todos os lados,
Apertam-me com vigor,
Excitando-me os sentidos

Ao corresponder
Às carícias com que me afagas
Sinto meu corpo
Levitar em sonoras vagas
Quando ao teu corpo
As mãos leves,
Embora céleres, lanço,
Em divina musicalidade, danço.

Quando nos lábios
Roçam-me os beijos teus,
Sinto-me um deus
A ensinar a outros sábios.

Quando de ti faço uso
Quando de ti abuso
Num constante extremo,
Mesmo fatigado,
Com os sentidos alterados
Alcanço o prazer supremo.

***

Ahhhhhhhhhhhhh

***

(Paulo de Morais
Livro: Tardes Trigueiras)

SUBLIME OBSESSÃO

Sublime obsessão me assalta a mente
Toda vez em que cerro os olhos meus
Buscando em singela oração a Deus
O bálsamo do amor sublime e ardente.

E, enquanto, absorto, nos enleios seus
Conservo o coração em luz candente,
Abraçar-me num beijo inocente
Vem cálida brisa dos olhos teus.

Por fim, na inspiração de uma evidência
Em almas que se buscam na existência
Remota epopéia sei que tivemos.

E hoje, dois caminhos de tal sorte
Nos hão de unir na vida e além da morte
E sempre...sempre unidos viveremos.

(Paulo de Morais
Livro: O Poeta e Seus Amores)

SUPER-EU

Pergunta-me a memória atrevida
Por que fui num baile de carnaval
Lançado a um combate desigual –
Essa dura batalha pela vida?

Num mar de tormentas descomunal
O prêmio máximo é a meta atingida
É um espaço, a glória, uma guarida,
O êxtase supremo, a vitória final.

Ser o mais ágil, forte, o mais esperto,
A cada braçada, do alvo mais perto,
Venci milhões, bilhões iguais a mim.

Na maratona das lutas, por fim
Contra a maré, destemido remei
E o óvulo, triunfante fecundei.

Desafios tantos que a vida nos suscita
Para nos testar seja quando e onde for,
Nossa real capacidade em prova pôr
Antes do bom êxito nos fazer visita.

Veja o exemplo, bas-fonds, que agora vou propor
E me responda, ainda que eu não insista:
Não tem a vida o mesmo sabor de conquista
Que, em chiste, cantei no soneto anterior?

Não, bas-fonds, não! Eu mesmo contrario que não.
Apesar de tudo, concordo com Platão:
“Vencer a si próprio é a maior das vitórias”.

Mas ai daquele que se jubila nas glórias
Da derrota alheia que para si atrai:
Pobre besta humana que pela vida vai...

(Paulo de Morais
Livro: Tardes Trigueiras)

VELEIRO

A vida corre como um veleiro ao mar...
Na madrugada, quando se lança na praia,
As ondas avisam dos perigos
E o incentivam a desistir

Ele, porém, impulsionado pela brisa,
Dá-lhe as costas e desafia o infinito

O sol surge
E no ápice
Sua luz quente queima o rosto do Veleiro
As gotas que brotam do seu rosto –
Irmãs no sabor (amargo) da amplidão marítima –
Sulcam-lhe a face
Mas o Veleiro
Apaixonado pelo oceano
Luta – acalma
Sofre – jubila
Chora – sorri
Vive – morre
Ano após ano
No doce bailar
Entre dois infinitos –
Acima, o céu
Abaixo, o oceano –
Num beijo eterno.

Surge a Tempestade
Sozinha sobranceira
Sublime aparição
De um sorriso arrebatador
E o Veleiro convida à dança
Toma-o nos braços
Dita-lhe o ritmo
De uma dança frenética e louca.

No auge supremo
Beija-lhe a boca...

O Veleiro não mais existe.

(Paulo de Morais
Livro: Tardes Trigueiras)

BANHO DE SOL

Coberto apenas o templo do amor,
No jardim do Éden Eva perfeita
Como um soneto que o poeta deita
Nas areias de meu São Salvador.

Pele bronzeada ao sol e ao calor
Lábios quentes, voz rouca, boca estreita,
Fartos seios, mãos, dunas, toda feita
Curvas onde o mar tempera o sabor.

Homero, Petrarca, Horácio ou Camões
Nem mesmo Anchieta nos versos canta
Tanta beleza que os olhos encanta.

No entanto na doce boca (que vejo?!)
Maldito cigarro a roçar num beijo
A lhe fustigar os pobres pulmões.

(Paulo de Morais
Livro: Tardes Trigueiras)

domingo, 16 de março de 2008

VENTO NA COPA

Realmente, os dias passam e as noites se vão
e você, a cada dia, mais longe do toque da minha mão...
Meus lábios no pensamento
procuram os seus por um beijo nesse momento...
Lembranças que o vento leva
para o passado vivido em treva.
Nem mesmo a ternura do seu olhar
vem agora meu coração afagar
Quando o sol, ao cair da tarde,
tristonho se aquieta, sem alarde,
sob a copa de um pé de manga que agita
a dor que no meu peito aflita...
dor que não passa nunca, nunca... e do mesmo jeito
que o vento na copa, agita meu peito
(Paulo de Morais – Livro Tardes Trigueiras)

NAS AREIAS DE COPACABANA

Caminho, lentamente, desposado,
em conversa frívola e animada,
as horas que passam são nada
quando estou com você, lado-a-lado.

Na orla marítima, tendo o olhar lançado,
ouço-te confessar apaixonada
por um mergulho em praia abandonada
qualquer noite dessas, de bom grado.

Arrebato-te ao colo e sinto correr
nas veias a ânsia do prazer
e no corpo o fogo da paixão.

Transporto-te ao mar e deito-te ao chão
extasiado na cruel gana
de amar-te nas areias de Copacabana.
(Paulo de Morais – Livro: O Poeta e Seus Amores)

SILHUETA

Noite. No céu, o luar é quem vela
Tão forte como que buscando entrever
Pelas cortinas que cerram a janela
O amor que está para nascer.

Quando a chuva na vidraça se esfacela
Esfriando o mundo em novo amanhecer
Dentro dessa improvisada capela
O amor se aquece na ânsia do prazer.

Por mais que a noite logo passe
E a chuva a vidraça logo embace
Vê-se pela janela a silhueta sua.

Mulher-moça, completamente nua,
Arrebatada nas asas da paixão
Cavalgando em “slow-motion”
(Paulo de Morais – Livro: O Poeta e seus amores)

domingo, 2 de março de 2008

DESOBEDIÊNCIA DOS FILHOS

Que atitude tomar ante a desobediência dos filhos?
As causas da desobediência infantil são quase sempre mal interpretadas pelos pais, e estes julgam que o castigo é a melhor forma de fazer com que aqueles reparem a falta cometida.
A lei prevê castigo adequado para quem comete crimes sociais. Ocorre, porém, que os crimes são, na atualidade, vistos pelo ângulo de quem tem maior poder aquisitivo, o que significa que nem sempre pelo lado da justiça.
O mesmo ocorre dentro de casa. O provedor da subsistência é quem exerce poder sobre os demais. Este representa a lei no lar; mas, é sempre justo? As penas são aplicadas de acordo com o seu bom ou mau humor, de acordo com o seu estado de espírito.
Diferentemente com o que ocorre com o juiz, os pais não cursam faculdade de Direito, não são submetidos ao exame na Ordem para habilitarem-se ao julgamento. Mas, com que expressão exercem o direito!
Será que os filhos conhecem as leis que regem a vida dentro do lar?
Nenhum cidadão pode alegar ignorância da lei. Isto não o isenta da responsabilidade pelo crime (considerando-se culpado, é claro). Nenhuma criança tem o direito de fazer o mesmo.
O cidadão adulto tem condições de conhecer a lei social. Ela está impressa nos compêndios de Direito. Justifica-se, portanto, a inutilidade da alegação de ignorância por parte do infrator. Ele a ignora porque assim o quer.
A criança, porém, ignora as leis de casa porque não lhe foram apresentadas e, pior, foram elaboradas sem o seu consenso e, pior ainda, dependendo da situação são alteradas sem o menor escrúpulo. E é esse, exatamente, o ponto que desejo ferir.
Se o adulto ignora as leis sociais por não querer conhecê-las, por não buscá-las, a causa está na infância quando lhe é negado o direito de participação dentro do próprio lar.
Mudar esse quadro é função educativa a que os pais devem se dedicar. Refletir sobre os tempos de suas infâncias, reconhecer como eram impedidos de apresentar motivos para desobediência, motivos que eram quase sempre por desconhecimento e quase nunca por rebeldia, é o caminho a seguir.
Depois, conversar sempre com os filhos, mostrando-lhes o porquê de tudo, solicitando-lhes compreensão e ajuda. Isto os fará educados. Quando forem adultos, assim agirão com seus próprios filhos dentro dos seus próprios lares, e, também, dentro do grande lar chamado nação.
O direito não é imposto, é conquistado.
Paulo de Morais

DO BERÇO ESPLÊNDIDO À COVA RASA

Desde o seu nascimento, o Brasil mostrou-se uma terra rica na qual muitos colocaram o olho grande, Ah se eu puder ter o controle dela, explorar o seu solo e dela retirar o ouro, o petróleo, os minerais, tudo para meu único e proveitoso desfrute.
O Brasil não se levanta do berço esplêndido, não engatinha, não dá os primeiros passos mas troca de ares. Sai do berço esplêndido no qual nasceu e transfere-se para a cova rasa, alquebrado, destruído, esquelético. Só os ossos lhe restam, ossos que um dia hão de virar pó e como tal serão levados pelo vento...
O Brasil está definhando. O gigante que se apresentava ao mundo no seu nascedouro como o “país do futuro” foi derrotado. O pior é que a culpa, a grande culpa dessa prematura morte não é só de quem o explora de fora, mas também dos que estão aqui dentro, sugando-lhe as energias, dia após dia, sem se perceberem que estão desfrutando apenas dos ossos ressequidos porque todo o vigor da carne, dos músculos, da vida já se esvaiu como gás no infinito.
O grande culpado por tudo isso estar acontecendo é você que me lê neste momento, como também é deste que te escreve neste mesmo momento. Nós somos os culpados quando vemos essa realidade saltar diante dos nossos olhos e não a combatemos; somos os culpados por continuar com a utopia de que o Brasil é mesmo aquele país do futuro e nada fazemos para mudar essa condição. É hora de parar de dizer que o problema é do governo, o governo é que tem de nos livrar da invasão que nos ameaça, que o problema é dos políticos, da mídia, dos professores, dos cartolas, mas jamais problema do povo, esquecidos, ainda, de que “o povo tem o governo que merece”. Se os governantes nada fazem é porque o povo – que os elegeu – nada faz.
Passam-se as datas comemorativas nacionais e já nem mais nas escolas são lembradas nem comemoradas! Transformaram-se em simples feriados nacionais. O povo brasileiro está se esquecendo do significado do Sete de Setembro. Essa data não representa um feriado, mas sim a luta de um povo pela sua independência. O Sete de Setembro deve ser lembrado como herança daqueles que deram suas vidas para que nossa cultura, nosso folclore, nossas riquezas não mais fossem retiradas de nós e retribuídas com a mesma porcaria de antes, ou seja, quando davam espelhos aos indígenas, nos quais eles se embasbacavam vendo-se refletidos num pedaço de vidro sem valor algum, em troca do ouro. E qual é a diferença para os dias de hoje? Já nos tiraram ouro, já tiraram daqui o pau brasil, o café, a cana de açúcar... hoje tiram nossos atletas, nossos cientistas, nossos pesquisadores, estão tirando nossa cultura, nossa Educação, nossa liberdade, nossa vida. E o que nos dão em troca? “Pedaços de vidro” sem valor onde nos vemos refletidos de forma irreal; não vemos mais a beleza que temos, a cultura que podemos ostentar, a Educação da qual podemos nos orgulhar; mas uma total falta de valor moral, cultural, educacional. É isso que vemos quando nos olhamos refletidos em nossos espelhos (dizem que os políticos são os representantes do povo): um povo sem cultura, sem passado, sem memória, sem educação. E o que fazemos? Colocamos a culpa no presidente, no governador, no prefeito, no cartola...
A cova é rasa e coberta de areia. Estamos enterrando o país quando valorizamos demasiadamente as coisas, as pessoas, os fatos, as datas que nada têm a ver com a nossa cultura e as nossas são esquecidas, exiladas, mortas e enterradas.
Que valor terá este artigo se apenas criticar a situação caótica em que vivemos sem apresentar uma proposta de solução? E aqui está: em primeiro lugar, resgatar os nossos valores nacionais desde antes do seu descobrimento, estudá-los e conservá-los diariamente; em seguida, rejeitar pacífica e obstinadamente todas as imposições que nos querem impingir de fora para dentro, recusando-se a assistir os programas de televisão e de rádio que não valorizem nossa cultura, nossa Educação. Mas não somente isso. Exigir dos responsáveis pela mídia que alterem a programação conforme o que for sendo proposto pelos telespectadores, na medida em que vão se educando.
Educar-se para apresentar uma proposta de solução sem medo de cair no ridículo, porque o ridículo é uma cova rasa.
Paulo de Morais